O dia que eu achei que chegaria na Áustria de bicicleta
Enquanto esperávamos o processo da cidadania italiana ficar pronto, e estávamos em férias do curso de italiano aproveitando os dias de sol, nada melhor do que planejar uma aventura, onde a ideia de: “poderíamos ir de bicicleta até a Áustria” parecia algo plausível.
Meia hora de Google depois e a equipe e o roteiro estavam formados para o dia seguinte. Uma das meninas, a Tainara, trabalhava num escritório de turismo da cidade então ficou encarregada de botar o roteiro em prática. Partiríamos pontualmente às 6 da manhã do dia seguinte, mas é claro que decidimos ir a uma festa na noite anterior o que nos proporcionou deliciosas 3 ou 4 horas de sono apenas. Imaginamos que seria difícil chegar até a Áustria assim de primeira, então decidimos que faríamos antes um pequeno teste, iríamos até a Comune de Feltre, que se localiza a uns 45 quilômetros de Bassano del Grappa. Se tudo desse certo e ninguém sofresse um ataque cardíaco, seguiríamos o caminho completo até a Áustria na próxima semana.
A ideia tinha tudo para dar certo, ir com nossas bicicicletinhas entre os vales italianos que protagonizaram tantas batalhas durante a Primeira Guerra Mundial, passar pelos lagos verde esmeralda, piqueniques pelas pequenas vilas ao caminho. Na nossa mente teríamos pessoas jogando pétalas de rosas das janelas ao nos verem passando, digno de um quadro do Rococó.
É claro que nosso plano deu tudo errado a começar pelas bicicletas. Alugamos as mais baratas que estavam disponíveis, e eu juro que essas bicicletas assim como os vales, também participaram da Primeira Guerra. A minha por exemplo não tinha nem marchas.
Compramos os mantimentos no mercado Prix e já deu uns 5 quilos a mais cada mochila. Acrescente 3 sacos de dormir (a Aline não quis comprar um, e quase teve hipotermia), mais a barraca, mais um colchão térmico, e muitas garrafas de água tudo nas nossas costas.
Eu estava com uma gripe absurda aquelas que a gente não consegue nem pronunciar as consoantes das palavras corretamente. Não vou nem adentrar nas cólicas que uma das meninas estava sentindo e se assemelhavam a dores de parto de um tiranossauro.
É claro que a gente nunca chegou a Feltre, quiçá a Áustria. Mas mesmo assim descobrimos um camping incrível na Comune de Arsié, 10 quilômetros antes do nosso destino final. E este foi o ponto mais incrível da viagem, pois é um lugar tão pequeno que jamais teríamos conhecido não fosse por estas desventuras em série
Camping Gaiole di Turra e Lago di Corlo
Encontramos dois campings pelo caminho, o Village Lago Arsié que estava bem cheio, então seguimos mais a frente até o Camping Gaiole di Turra. Ele fica nas margens do Lago di Corlo, é bem frio a noite. Pagamos uma taxa de 20 euros pelo grupo, que incluía acesso aos banheiros. Montamos nossa barraca próximo as árvores e fomos conhecer o lugar.
O Lago di Corlo tem sua água que vem do degelo, então calcule o frio. Vamos entrar, claro que vamos. Mas só eu e a Tainara tivemos coragem. O local parece uma pintura com as igrejas enquadradas pelas montanhas e rodeadas pelo lago.
A noite faz um frio muito terrível, e a nossa barraca era menor do que a quantidade de pessoas que cabiam nela, quase congelamos. Tinham vários trailers de casais idosos que estavam passando a semana por lá, inclusive um deles emprestou um carregador portátil, já que nenhuma tomada funcionava por lá.
A volta foi mais complicada ainda, uma das bicicletas pré-históricas furou o pneu no meio do NADA. Tentamos consertar mas não rolou. Por sorte um casal de holandeses que sim conseguiram ir até a Áustria e estavam voltado, tinham um kit de conserto de pneus de dar inveja ao MacGyver. Fizemos amizade e o senhor muito querido arrumou para nós. Alguns quilômetros afrente adivinha só? Furou de novo. Choramos? Desistimos? Não! O casal de holandeses passou por nós de novo, e consertou pela segunda vez.
E não é que o maldito pneu furou pela TERCEIRA VEZ? Por sorte estávamos já em um vilarejo, onde tivemos que pedir ajuda aos moradores. Era domingo, e o único senhor que nos ajudou estava totalmente embriagado e depois de uma hora mexendo na bicicleta viu que não tinha conserto. Disse para dele o filho dele levar a dona da bicicleta até em casa, já que o carro tinha um lugar só. Por sorte, enviamos nossas mochilas na carrocerias e o resto da viagem foi muito mais fácil. Em uma horinha chegamos em Bassano vivas e rindo muito de tudo que deu errado.
No final, conhecemos um lugar muito incrível que está totalmente fora dos roteiros turísticos e nos sentimos em conexão com a natureza, aprendemos que não se deve viajar sem um certo planejamento e a conhecer nossos limites. 6 meses morando na Itália comendo pasta e pizza não são um bom condicionamento físico para uma viagem tão longa dessas.
O roteiro de todas as paradas que fizemos pelo caminho está neste post aqui.