Daniela Menti

Sabe amor que você sente por um país que você não tem nada em comum, mas mesmo assim ele te desperta uma certa curiosidade? Muita gente sente que tem que ir para Londres, outras sonham em ser pedidas em casamento em frente a Torre Eiffel. Meu caso de amor é um pouco diferente.

Black Sand Beach – Vik

Certa vez matando tempo no trabalho esperando dar a hora de finalmente ir embora e contar quantas horas de sono eu teria até o outro dia para fazer exatamente a mesma coisa, abrindo uns links aqui e ali, encontrei umas imagens de cachoeiras lindíssimas, geleiras, e vulcões. Ué, que lugar louco. Salvei nos favoritos.

Godafoss, tava morrendo de medo pra subir ai

Na mesma semana passou no Globo Repórter (quem me conhece sabe que sexta a noite é sagrada para ver o Globo Repórter sobre viagens), me aparece a Gloria Maria em frente àquelas cachoeiras que eu tinha visto dias antes. Foi amor na hora. Comecei a pesquisar sobre, e mais eu sentia que precisava conhecer aquele lugar, onde tudo é extremo. Ou é gelo, ou é deserto. Ou é noite metade do ano, ou o sol brilha durante a meia noite

23:00 em Reykjavík

As informações sobre mochileiros, ou excursões pra lá eram pouquíssimas e bem desatualizadas. A única coisa que eu tinha em mente é que seria uma viagem bem cara. Nesse momento eu já tinha assistido Sense8, chorado com as cenas da Riley nas montanhas Islandesas, e tinha certeza que eu precisava conhecer aquelas paisagens. E essa ideia fiou guardadinha no meu coração. Foi tipo “ativar o soneca do celular”, sabia que uma hora eu conseguiria.

E não é que consegui? Vou pular o drama por que isso não nos interessa no momento. Vamos lá

1 – Confiar na galera da internet

Ok, agora explica, como diabos você chegou na Islândia? Então, num grupo de couchsurfing no facebook, uma menina postou “estou procurando alguém para dividir um carro e fazer o Ring (percurso que circula toda Islândia). Ué, por que não? Engraçado que tudo deu errado, a principio não tinha mais lugar, e eu teria um compromisso na data. Um dia depois ela me chama “hey, ainda ta afim?, tem mais um carro indo com nós” E fui jogada num grupo de 10 brasileiros, um de cada canto do país. E lá fui eu, sem conhecer nenhuma alma, comprei as passagens, comprei o saco de dormir, arrumei uns casacos emprestados e vamos lá!

Ring Road e a galera

2 – Dormir em aeroporto

Esta foi a primeira vez que eu dormi no chão de um aeroporto. Claro que as passagens mais baratas estavam marcadas na data e no lugar mais complicados possíveis. Eu sairia de Treviso na Itália, até Stansted, em Londres, onde o vôo seria as 7 da manhã, porém eu chegaria as 21h. Isso significa que? Yay, bora dormir no aeroporto! Nesse ponto eu já tinha encontrado a Bibi, e zeramos o estoque de assuntos possíveis, mas logo arrumávamos outro. Chegando em Londres iriamos encontrar parte do grupo. Obviamente chovia em Londres, e demoramos um tempo até achar a parte da galera. Encontramos a Ju, que nos apresentou nosso dormitório, um belo chão pertinho da maquina de doces. Estendemos nossos casacos, e dormimos com toda nossa elegância.

Hora do soninho

Eu vou pular o fato que mesmo tendo chegado quase 10 horas antes do voo pra Reikijavik, nos quase perdemos o voo ❤ e o mais legal, o próximo vôo para lá seria dentro de 4 dias. Uma delicinha, não? Corridinha matinal feita, seguranças devidamente xingados mentalmente por implicarem com um potinho de creme Nívea, e chegamos 8 minutos antes do portão fechar, um glamour só.

3- Traficar Sopa Verde

Tendo em mente que a Islândia é absurdamente cara, e com raros mercados, saí com o mochilão cheio de alimentos deliciosos que consistiam em um estoque de sopa verde em pacote, molho enlatado, muitas latas de atum, bolachas, e um pacote de macarrão. Fiz a contagem do estoque de chocolates e vi que tinha demais, o que eu não sabia é que iria conhecer pessoas tão legais e eu ia gostar delas tanto ao ponto de dividir meus doces.

Sopinha de sódio nossa de cada dia

4 – Montar Cardápios com Atum, Sopa Verde e Macarrão

Como eram dois carros, vou focar na nossa van, carinhosamente chamada de Carreta Furacão. Eu, Ramon, Paulina e Bibi descobrimos ser grandes amantes do famoso “prato de pedreiro”. Depois de acharmos um mercado e comprar uns 6 kg de salsicha (incluindo salsicha enlatada que descobrimos ser cenoura, péssimo trabalho em designers islandeses). Nosso cardápio por 8 dias consistia em uma mistura de grãos ao molho agridoce, com peixe norueguês e pasta ao molho pomodoro, que nada mais era que massa, feijão enlatado e atum, tudo bem misturadinho. Uma maravilha maior quando misturamos salsicha junto a esta especiaria.

Foto não faz jus a maravilha gastronomica

5- Lavar a louça em QUALQUER lugar

Sabe essa louça cheirosa de atum e feijão da foto acima? Primeiro preciso explicar que estávamos em dois campers pequenos, e gastar água para lavar louça toda hora não é um luxo muito bom pra Islândia. Logo, deixávamos a louça até chegar num ponto estratégico, isso inclui, lavar seus pratos e panelas no banheiro do Subway, na mangueira do chão do posto, ou mesmo na ópera mais chique de Reykijavik (essa mesmo que o pai da Riley se apresenta em Sense8) bem no dia que está tendo o maior espetáculo da cidade.

bora perder os dedos lavando a louça

6- Ninguém morre por falta de banho 

8 dias na Islândia, o clima variava entre 3–8 graus, sensação térmica com o vento descia lá na casa dos milhões negativos. Sério, era muito frio, sendo que fomos no “início do verão”. Não existem opções de banhos, igual nossos postos de gasolina no Brasil. Ponto. Ficar em hostel estava totalmente fora de nosso poder aquisitivo. Alguém ai arriscaria uma gangrena num banho de água fria da mangueira do posto? Eu acho que não.

Até tem uns lugares com água quente, mas não sei se são muito recomendáveis

 

7 – Tomar banho na Islândia é caro

Encontramos um camping, lá no quinto dia, que era possível tomar banho por um preço agradável de uns 30 euros por 5 minutos. Agora entendo os desodorantes de proteção 72 horas.  Sim o cabelo fica horrível, a pele fica nojenta, nos sentimos mal, mas isso são nos primeiros dias, logo acostuma. Ninguém morreu, e afinal, lencinhos umedecidos podem salvar vidas.

Você vai mesmo se estressar por falta de banho nesse lugar?

 

8 – Lidar com espaços pequenos

Nosso camper era para 5 pessoas, 3 dormiriam embaixo e duas em cima. Vocês não tem ideia do que é dormir com esses dois palmos de altura ai, enrolada no saco de dormir, com um aquecedor a todo vapor. Óbvio que acordei varias vezes na noite sonhando que estava morrendo.

Quem perder no par ou ímpar dorme em cima

9-Ter medo de tempestades

Como não anoitece nessa época na Islândia, nos passamos no horário, e era quase uma da manhã, quando resolvemos procurar um lugar para estacionar os campers. Aquela noite vi que não somos nada perto da natureza. Estávamos numa estrada totalmente descampada, onde só se via o terreno coberto de pedras, por kilometros. O vento era pior do que a colina do filme Os 8 Odiados. Estacionar no acostamento é proibido e dá uma multa do valor da nossa dignidade na Islândia.

Esta era a visão da estrada por horas

10 – Dar valor às coisas simples

Esse item é o maior clichê de todos, mas pela primeira vez fez sentido pra mim. Nunca mais, nunca mesmo eu vou reclamar do meu chuveiro entupido. Agradecer por estar em casa no meio de um temporal. Passar 8 dias sem nenhum meio de comunicação foi tão bom para todos.

Conversamos sobre todos assuntos possíveis e isso nos aproximou tanto que parece que nos conhecíamos de outra vida. A Islândia vai ficar pra sempre no meu coração junto com s amigos que fiz nela. Me arrependo de algum desses perrengues? Absolutamente nenhum, faria tudo de novo? Com toda certeza do mundo! (porém eu levaria mais lencinhos umedecidos dessa vez).

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